A crise energética, a geopolítica e os direitos humanos

Autor: STIEESP

1 de novembro de 2022

Quando inúmeros sindicalistas, ambientalistas, estudiosos e especialistas
afirmam e alertam que a energia não pode ser tratada como uma mercadoria –
mas sim como um direito – além de ser um insumo vital para o
desenvolvimento de um país ou de uma região, trata-se de um aviso: temos
que refletir sobre o tipo de economia e de sociedade que queremos e o que
estamos fazendo de concreto para debelar a grave crise energética mundial.

Ao longo de décadas, as economias nacionais ao redor do mundo basearam
sua matriz energética em combustíveis fósseis, como o petróleo, o gás e o
carvão. No entanto, essas são fontes finitas de energia, ou seja, um dia elas
vão acabar, além de serem altamente poluentes. Logicamente, os países com
grandes reservas destes recursos acabam se envolvendo em um jogo de poder
no mapa político mundial. Países querem vender, países querem comprar, e,
como em toda negociação, as estratégias pressionam quem está do outro lado
da mesa.

Ocorre que, a questão energética vai muito além de melhorar a qualidade de
vida das pessoas: ela afeta o desempenho das empresas, das políticas
econômicas, do desenvolvimento tecnológico, e, por fim, a soberania nacional
e o poder que alguns países possuem, em escala mundial. Controle de preços,
quantidades produzidas, busca por fontes energéticas renováveis e cuidados
com o meio ambiente são alguns itens que são colocados na negociação.

O exemplo mais recente da gravidade da crise energética que assola o mundo
ficou às claras com a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, grandes produtores de
gás e petróleo no leste europeu. Nestes países, ficam os espaços por onde
passam os gasodutos que levam petróleo e gás para a Europa – é aí que
começa o conflito geopolítico que vem ganhando uma escala perigosa,
afetando vários países e preocupando milhões de pessoas.

 

No dia 27 de setembro, foram identificadas enormes bolhas nas águas do mar
Báltico, que, dentre outros países, banha Rússia, Polônia, Suécia, Dinamarca e
Alemanha. Essas enormes bolhas são decorrentes de duas fortes explosões
dos gasodutos que saem da Rússia e vão até a Alemanha. No momento, existe
grande movimentação de órgãos governamentais e de empresas para
identificar as causas de tais explosões.

 

Ao iniciar a guerra contra a Ucrânia, a Rússia sofreu críticas e sanções por
vários países europeus e instituições da região. Até mesmo a OTAN
(Organização do Tratado do Atlântico Norte) foi envolvida, por causa da sua
atuação no campo militar, que, segundo líderes russos, seria uma ameaça à
soberania do país.

Os russos, como forma de pressionar que a Europa não seja solidária com a
Ucrânia e para pressionar para que não sejam enviados equipamentos
militares para ela, reduziram e até cortaram o fornecimento do gás e do
petróleo extraído de seu território.

Ocorre que, a energia, com todas as suas diferentes fontes, transformou-se
num bilionário negócio, um fator de pressão política e econômica – além, é
claro, de ser um direito das pessoas. Imagine o problema político, econômico e
de vida de seus habitantes, para um país sem gás, petróleo ou eletricidade.

A Rússia culpou a empresa americana Siemens, fornecedora das turbinas que
mantêm os gasodutos em funcionamento, pela redução da pressão dos
mesmos e até pela interrupção do fornecimento, uma forma de justificar o não
cumprimento de contratos de fornecimento de gás e petróleo. Após ser
desmentida pela empresa, a estratégia russa foi culpar a Ucrânia de sabotar os
dois gasodutos: outro motivo de força maior para que as referidas multas não
fossem cobradas.

As investigações ainda estão em andamento, mas é muito provável que as
explosões tenham sido provocadas pela mão humana, e, agora, resta saber de
quem são essas mãos. Neste meio tempo de acusações, quedas de braço pela
busca ou pela manutenção do poder político e econômico de países, e,
pasmem, de empresas, os preços da energia dispararam.

Governos transferem polpudos subsídios para empresas fornecedoras de
energia, a oligarquia energética mundial fica ainda mais rica e a população
europeia, além de correr o risco de ficar sem energia durante o inverno, ainda
está pagando escandalosos aumentos das tarifas de energia – e o discurso dos
governantes e dos empresários é de que é preciso o sacrifício de todos.

É preocupante que uma potência mundial, como a Alemanha, corra o grande
risco de um colapso energético, tendo em vista que 40% do gás e do petróleo
usados são importados da Rússia. Também é preocupante que, em um
momento de crescimento político da direita ultraconservadora e da xenofobia, a
Alemanha tenha que assinar acordos de fornecimento de gás com países do
Oriente Médio que não respeitam os direitos humanos. A que ponto chegou:
para comprar gás e petróleo somos quase que obrigados a aceitar, mesmo que
temporariamente, ataques, retrocessos ou avanços insuficientes dos direitos
humanos.

 

Enquanto isso, por aqui em terras brasileiras, a boiada continua a passar. Os
jabutis do gás, que foram colocados no processo de privatização da Eletrobras,
em breve serão o motivo do maior enriquecimento das grandes empresas do
setor energético. Muito provavelmente, mais uma vez, a bomba vai estourar no
colo do consumidor, que verá o preço da energia subir acima do necessário,
comprometendo a economia nacional, o funcionamento das empresas e a
qualidade de vida de todos nós.

Passada a ressaca das eleições, os sindicatos dos trabalhadores do setor
energético devem iniciar uma grande campanha de conscientização dos
trabalhadores e da sociedade em geral sobre a importância de um marco
regulatório para o setor, que não seja apenas uma ação entre amigos de
políticos e de empresários inescrupulosos, que colocam o lucro acima da
soberania energética, dos direitos e das vidas das pessoas.

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