Realmente, vivemos uma era de intensos avanços tecnológicos. Em todos os segmentos de nossas vidas, nos deparamos com novidades, que facilitam e melhoram a qualidade de vida de boa parte da população.
É possível fazer muita coisa pelo celular ou pelo computador e todo dia surgem aplicativos que possibilitam realizar compras, pesquisar locais, negócios, perfis, dados, informações diversas, agendar e comparecer a consultas médicas, estudar, apoiar tratamentos e a recuperação física de pacientes e pessoas com alguma limitação, entre outras tarefas.
Assim como uma moeda (um dos maiores símbolos do capitalismo), a tecnologia possui duas faces: uma delas foi superficialmente citada acima, a outra, que não é benéfica, produz terríveis efeitos na sociedade – ampliando, muitas vezes, as já incômodas e gritantes desigualdades.
A tecnologia deveria favorecer a todos
Nas escolas da periferia, não existe internet de qualidade, e, quando existe, as famílias mais pobres, que não têm dinheiro nem para comer, sofrem para ter acesso à rede em casa.
O resultado dessa condição é conhecido: milhões de jovens têm sua educação limitada e seu desenvolvimento intelectual comprometido, em relação aos jovens de famílias com mais posses. Não podemos nos deixar enganar por aqueles que escondem a desigualdade sob o manto alienador e anestesiante da meritocracia.
As pequenas e médias empresas, que são as que mais geram emprego no Brasil, não têm recursos e nem capacidade suficientes para investirem em tecnologia e se beneficiarem de novas ferramentas de gestão, produção e melhoria do seu negócio. Enquanto isso, a maior parte dos recursos públicos é direcionada para as grandes corporações, que, em nome da atualização tecnológica e do aumento da competitividade, contribuem para a manutenção dos altos níveis de desemprego, da terceirização, da precarização e da informalidade.
A diferença entre as duas faces da moeda “tecnologia” também é percebida no acesso à saúde, à alimentação, ao lazer, à justiça, à habitação, à segurança etc. A tecnologia prioriza os países que possuem maior desenvolvimento tecnológico e científico, as grandes corporações transnacionais e as famílias com mais dinheiro, enquanto os demais aguardam a sua vez (que nem sempre chegará).
O trabalho e a tecnologia
Há algumas décadas passadas, seria praticamente impossível imaginar robôs montando carros, fazendo cirurgias, limpando casas, servindo refeições, consertando máquinas etc. Hoje em dia, já robôs são testados para realizar a manutenção em redes de energia elétrica, e os avanços tecnológicos não param. Mas, ao mesmo tempo em que criam oportunidades de empregos para aqueles trabalhadores com conhecimento específico, eles também criam muros cada vez mais altos, que dificultam o ingresso no mercado de trabalho daqueles indivíduos que foram privados da inclusão digital e da boa escola.
A tecnologia afeta, para o bem ou para o mal, direta ou indiretamente, todos os segmentos do mundo do trabalho. A mais recente ocorrência se deu no campo da entrega de alimentos ao consumidor, o conhecido delivery.
No dia 21 de janeiro, a ANAC (Agência Nacional da Aviação Civil) concedeu a primeira autorização no Brasil para a utilização de Drones em entregas de até dois quilos e meio, num raio de três quilômetros. Mesmo com o destaque de que se trata de uma atividade complementar ao trabalho dos entregadores, fica claro que este é mais um passo em falso da tecnologia, quando se trata de gerar mais empregos de qualidade e mais oportunidades para os trabalhadores do segmento de entregas via plataformas.
A ideia de tal iniciativa é que os entregadores retirem as entregas em um droneport e levem-as até os consumidores. Qual a garantia de que, amanhã, um drone não vai tocar a campainha de nossas residências? O que acontecerá com os entregadores, que perderão seus postos de trabalho para os drones?
Infelizmente, essa medida acarretará ainda mais prejuízos aos trabalhadores do segmento de entregas via aplicativos. Recentemente, foi acolhido pelo Congresso Nacional um projeto de lei que, em vez de combater a precarização do trabalho no setor, simplesmente regularizou essa precarização. Não podemos nos calar diante de posturas dos nossos legisladores, que ignoram, por completo, a necessidade de valorizarmos o trabalho como alicerce do fortalecimento da economia nacional e da dignidade humana.