Os motivos são muitos: falta de tempo, falta de dinheiro, falta de lugar para comer, entre outros. Se passar vontade de comer já é difícil, imagine passar fome: precisar e não ter o que comer.
A ingestão de alimentos é uma necessidade fisiológica do organismo humano, assim como respirar, descansar e beber água. Estar alimentado é essencial para a vida e para a saúde do ser humano, e, não à toa, a alimentação é um direito de todos os indivíduos.
A fome é capaz de levar as pessoas a tomarem atitudes e praticarem ações que jamais pensariam em tomar. Estas ações, quase sempre negativas e carregadas de um sentimento de incapacidade de mudar as condições momentâneas de vida, podem levar a um sentimento de fracasso, com desdobramentos de valorização da própria vida.
Certo dia, meu irmão voltava do trabalho, e, ao passar pelo Viaduto do Chá e ver um homem prestes a se atirar, segurou-o pelo braço e perguntou o motivo para tirar a própria vida. Entre soluços e um forte pranto, o homem disse que havia dois dias que não conseguia levar um pedaço de pão para casa, e seu filho pequeno chorava de fome. Meu irmão convenceu aquele indivíduo a não se matar e deu dinheiro para que ele pudesse matar a sua fome e de sua família.
Ninguém passa fome por que quer
É triste a constatação de que a fome voltou a assombrar a vida de milhões de brasileiros, ainda mais porque o Brasil é um dos maiores produtores de alimentos do mundo. Vale lembrar que a alimentação é um direito do homem e uma obrigação do Estado. Além de ser um Direito Humano previsto na Declaração dos Direitos Humanos, foi aprovada em 2010, no Brasil, a Emenda Constitucional nº 64, que inclui a alimentação no artigo 6º da Constituição Federal. É preciso que o efetivo combate à fome saia do papel e se materialize em políticas públicas de Estado.
A Segurança Alimentar deve ser um eixo transversal em todas as ações de qualquer governo – passando, principalmente, pela geração de emprego e de renda, que permita que as pessoas ganhem o suficiente para o seu próprio e digno sustento. Além disso, a Assistência Social deve dar conta de que nenhum brasileiro ou imigrante que aqui viva passe fome.
O poder e a fome
Ao longo da história da humanidade, são vários os exemplos de que a fome e a miséria contribuem diretamente para que o povo questione seus governantes e lute por melhores condições de vida, mesmo que tenha que pegar em armas.
O maior exemplo é a Revolução Francesa, que foi resultada da forte crise vivida pela França no final do século XVIII, e que ocorreu, simultaneamente, nas esferas econômica, política e social. Essa crise na França foi consequência direta de uma sociedade marcada pela desigualdade típica do Antigo Regime, nome pelo qual ficou conhecido o absolutismo na França.
A maioria dos brasileiros ficou estarrecida quando as imagens de pessoas disputando ossos em um açougue para matar a fome tiveram o efeito de um soco na cara da sociedade.
Atualmente o país, tal qual a França nos idos do século XVIII atravessa uma forte crise econômica, política e social, cerca de 40 milhões de brasileiros vivem na pobreza, mais de 10 milhões estão abaixo da linha da pobreza, são miseráveis, 14 milhões estão desempregados e quase 50 milhões trabalham na informalidade. É certo que nenhum destes nossos irmãos pediu para passar por isso.
Será que a fome, a descrença nas instituições, a falta de perspectivas de ascensão social e o repúdio à ilha da fantasia em que vive a maior parte da classe política, mais uma vez, moverão a engrenagem da revolta social contra um governo que dá as costas para o seu povo? Somente quando o povo se conscientizar do seu poder, ele voltará a ser o protagonista da definição do seu futuro.
Sem exercer a cidadania, sem consciência política e sem lutar pelos seus direitos (e pelos direitos dos demais), o povo ficará à mercê de ações políticas esporádicas e passageiras, que, apesar de atacarem um grave problema – a fome – têm por objetivo afastar a ameaça de uma revolta popular na direção de uma sociedade justa e democrática.
Precisamos de líderes competentes e comprometidos com o bem estar de todos. Queremos líderes populares, e não populistas, que falam das agruras do povo somente da boca para fora.